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O Universo Ensimesmado dos "Aspies"

ARREDIOS E INTELIGENTES: Os portadores de Asperger, uma das Síndromes que compõem o espectro autista, costumam ter dificuldade na interação social, fazem interpretações literais da linguagem e tendem a comportamentos estereotipados. No entanto, o desenvolvimento cognitivo é preservado, indo do normal ao elevado. Estima-se que uma pessoa em cada 250 sofra da Síndrome.


Mais comum no sexo masculino, a Síndrome de Asperger difere do autismo clássico por não apresentar atraso ou retardo nas áreas cognitivas e no desenvolvimento da linguagem.


A Síndrome recebeu seu nome de um pediatra vienense que, em 1944, descreveu pela primeira vez um grupo de crianças que mostravam alguns traços autísticos - dificuldade de interação social, falta de jeito, tendência a comportamentos repetitivos e estereotipados - não associados com retardo mental e muitas vezes com inteligência superior à média.


Mas foram necessários 50 anos para que a Síndrome de Asperger encontrasse lugar no Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais - DSM-IV*. E mesmo hoje a diferença entre Asperger e autismo de alta funcionalidade ou alto desempenho (HFA, sigla em inglês) precisa ser mais explicada, ainda que os dois distúrbios estejam classificados de maneira distinta. A situação se torna ainda mais confusa com a grande variedade de sintomas que os caracterizam. Mas onde fixar a fronteira entre patologia e modo de ser? "A variedade dos distúrbios de desenvolvimento e a dificuldade do diagnóstico podem levar a por no mesmo caldeirão situações muito diversas", nota o médico Paolo Cornaglia Ferraris, autor de Asp Asper Asperger, livro em que uma criança "como todas as outras, mas não muito igual-igual", conta na primeira pessoa o desafio de viver com "um distúrbio de relacionamento que tem a ver com a dificuldade de regular os órgãos de percepção". Os portadores da Síndrome de Asperger sofrem, de fato, de uma espécie de hipersensibilidade sensorial e emotiva que torna difícil inserir-se num ambiente apinhado, barulhento ou muito iluminado, "como se qualquer forma de comunicação tivesse um volume muito alto para ser tolerado".


Entre normalidade e deficiência há um limite sutil, que pode depender de muitas variáveis, como o contexto familiar ou o ambiente escolar. São as circunstâncias que permitem a um adolescente com Síndrome de Asperger desenvolver a inteligência que, aliada a uma incansável dedicação às matérias preferidas, pode ajudá-lo a abrir caminho para a sociedade e para ele próprio aceitar o seu comportamento. Em um contexto diverso, o mesmo adolescente poderia ser rotulado como deficiente antes de ter a possibilidade de mostrar seu valor. O mesmo vale para os adultos. Há portadores da Síndrome que passaram toda a vida sem um diagnóstico, aprendendo a conviver com suas estranhezas. Outros casos são mais dramáticos, e há quem viva à margem do convívio social.


O DSM-IV*, porém, busca traçar um limite: os diversos sintomas representam uma Síndrome quando começam a comprometer seriamente uma área importante da vida, como o trabalho ou as relações afetivas e sociais. Mas são mesmo os sintomas que constituem o problema? "É difícil dizer se são nossas 'fixações' que tornam difíceis nossas relações com os outros ou se a dificuldade de se comunicar faz com que nos concentremos no que fazemos melhor", observa um adolescente com Asperger.


"Ao meu ver, a Síndrome é apenas um modelo cognitivo diferente, que comporta forte tendência à sistematização e certa dificuldade em estabelecer relações empáticas com os outros", explica Simon Baron-Cohen, diretor do Centro de Pesquisa em Autismo da Universidade de Cambridge.


No mundo dos aficionados pela informática, aspie - o termo familiar com que se autodefinem os portadores - tornou-se quase sinônimo de cdf. Tanto que são vendidas camisetas e xícaras ou mouse pads com escritos como "Adultos com Asperger: não queremos a cura (não aquela que alguém tenha escolhido por nós)". Enquanto isso, nos sites sobre aspies, multiplicam-se as "instruções de uso" para falar com os outros, os chamados "normais": aprenda o que é metáfora; pergunte como vai a um estranho mesmo que a saúde dele não te interesse.


Os indivíduos com a Síndrome são pessoas mais frágeis que a média do ponto de vista evolutivo, porque a sua dificuldade de entender o pensamento dos outros os torna vulneráveis: mas uma sociedade igualitária deve estar em condições de tolerar diferenças e variantes", conclui Paolo Curatolo, professor de Neuropsiquiatria Infantil da Universidade de Roma. Enquanto isso, do universo dos aspies ecoa uma pergunta ainda sem resposta: o que é normalidade, e quem está em condições de avaliá-la?


Por Paola Emília Cicerone, Jornalista Científica


FONTE: Revista Mente&Cérebro - Doenças do Cérebro - Autismo

http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/fascinios_e_misterios_das_doencas_do_cerebro.html


* Hoje, o termo adotado pela Associação Psiquiátrica Americana - Transtorno do Espectro Autista - TEA - inclui, além do autismo propriamente (de Kranner), as Síndromes de Asperger e a de Rett, assim como o transtorno desintegrativo da infância e o transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação do DSM-IV. Ele é caracterizado por déficits em dois domínios centrais: 1) déficits na comunicação social e interação social e 2) padrões repetitivos e restritos de comportamento, interesses e atividades. DSM-5, 2014.




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